sexta-feira, 11 de maio de 2012

Sexta-feira da compaixão

Passa das sete e meia da manhã e a Queima das Fitas ainda está a desfazer a tenda. Na Praia de Matosinhos e na Praia Internacional do Porto, dorme-se, mergulha-se, fuma-se, bebe-se, vomita-se e fornica-se. As esplanadas do Edifício Transparente, pejadas de garrafas em cacos e cadeiras partidas, parecem um campo de batalha sem sobreviventes. Na rotunda da Anémona, uma pequena multidão de ressacados espera de orelha caída pelo autocarro. Têm tratamento de claque de futebol: estão enjaulados e vigiados à distância de um dedo pela polícia de choque.
Três miúdas cambaleiam pela Avenida de Montevideu, aparentemente em direcção à Foz. Nos intervalos entre cabeçadas contra painéis publicitários e tropeções nos mecos de delimitação do passeio, pedem boleia aos carros que passam. São mesmo miúdas, caloiras da vida, naquela idade e naqueles corpinhos que o sacana do arguido aproveita sempre para se defender, dizendo: "Senhor Doutor Juiz, ponha-se no meu lugar".
Uma delas salta para a estrada, faz sinais ostensivos, quase desesperados, para que os carros parem e as levem dali. Só as buzinas lhe dão troco. E os trolhas das carrinhas cheias de pressa e juízo mandam-lhe a boca da ordem, "Ó filha, és toda boa", mas boleia é que nada. "Foda-se! Ninguém tem compaixão", lamenta-se a miúda, mais para si mesma do que para as outras, num desgosto que só visto.
Ela é nova e não sabe. Às vezes há quem tenha "compaixão", "compaixão" até demais. E é aí que o tribunal entra na história...

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