quarta-feira, 10 de julho de 2013

A verdade sobre as gaivotas

Foto Hernâni Von Doellinger

Gaivotas é comigo. Tenho até uma que faz questão de me vir cagar à varanda. Estou agora a escrever e estou a ouvi-las, a vê-las à minha frente, do lado de lá da janela. Eu e as gaivotas somos inseparáveis. Cúmplices. Somos um para as outras. Fui o primeiro a alertar para os perigos que corre o extraordinário gaivotal da Riguinha e Carcavelos, orgulho e emblema da Praia de Matosinhos. As gaivotas interessam-me. Cagam-me em cima, é certo, mas muito menos do que o Portas e o Passos Coelho, e eu não os conheço de lado nenhum e não me interessam para nada. Gaivotalmente falando, levo já mais de 25 anos de trabalho no terreno, eu e elas, contra a vontade da minha mulher, por causa da limpeza da varanda. Estou portanto em condições de afirmar, sem temer desmentidos, que sei de gaivotas como se fosse gaivoto. Houvesse um presidente da república das gaivotas e seria eu.
Ora bem. Outro especialista, mas este da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves, disse hoje às notícias que as gaivotas andam a mudar-se do mar para a cidade. Pois andam. O caro colega afiança também que o "fenómeno" começou exactamente há dez anos, mas que, atenção, está a aumentar com "o calor elevado que se faz sentir neste momento".
Não sei se o "fenómeno" começou mesmo há dez anos - não os contei, não sei sequer se o "fenómeno" é fenómeno realmente, mas afirmar que a vaga de calor dos últimos dias puxou as gaivotas ainda mais para terra é ciência de atirar à sorte a ver se acerta. E não acertou. Ou então as gaivotas de Matosinhos são umas desalinhadas, só para chatear.
Explico. Hoje há um nevoeirinho manso ali na praia, uma brisazinha de norte passa aqui pela rua como quem não quer a coisa, e elas aí andam, as minhas gaivotas, nos telhados, na varanda, conversadeiras e cagonas, aproveitando a fresca como eu. Mas nos dias de brasa da última semana, não. Pelo contrário. A canícula devolveu-as ao mar e estragou a teoria de sofá do ilustre ecologista. Quem as quisesse ver, era na água, bandos imensos, uns cem metros para dentro da linha de rebentação. Porque não são parvas. É. Já escrevi e repito: as gaivotas têm merda na barriga, não na cabeça.

5 comentários:

  1. "GAIVOTA I

    A tão difícil paz facilmente alcançada
    a máxima inquietação ao fim e ao cabo queda
    a serenidade em duas curtas asas resumida
    em corpo tão pequeno a vida toda
    a voz da ambição afinal muda
    perfeitíssima obra onde tudo se equilibra
    - que assim se cubra quanto tanto se celebra
    e uma chave só tal mundo abra a ninguém lembra

    GAIVOTA II

    Inúmera serenidade em duas breves asas resumida ó gaivota"

    (Ruy Belo, Obra Poética, Volume 2, Ed. Presença).

    Abraço. Luís Carvalho

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  2. Vais passar a ser o "se" Gaivota!
    Grande Abraço,
    P.

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  3. mas há um presidente da república das cagarras

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