quarta-feira, 1 de julho de 2015

Follow me ou o fado do desgraçadinho

                                                                                   Foto Hernâni Von Doellinger

Foi em Setembro que te conheci, òs anos, quando o aeroporto de Pedras Rubras ainda nem se chamava aeroporto Praça Velásquez. Não havia chopingues como agora, o FC Porto jogava na Madeira, com o Marétimo, e a gente, eu mais o Sarafim, íamos passar um domingo de categoria a ouvir o relato no tijolo do Sarafim e a esgravatar engate nas Departures e Arrivals ou no terraço das excursões de nariz para o ar a verem aterrar e levantar aviões. Tu também lá ias com os parolos dos teus pais, que por acaso até me resultaram boas pessoas, e trazias a tua inseparável amiga Benilde, em quem o Sarafim se pôs numa fervurinha e como quem não quer a coisa. Adiante. Foi lá que te vi pela primeira vez em toda a tua excelsa Glória - Glória da minha terra, Glória de Sousa, Glória efémera -, no bar do aeroporto, que era só um e parecia um tasco. Foi tiro e queda: entrei caçador e saí caçado, apanhadinho de todo. Se calhar foi amor aquilo. Lembro-me como se fosse hoje: eras linda, num vestido justinho de chita às ramagens verdes estampadas, com umas sandálias rasas, pois, talvez estivesses de calças de ganga e botas de cano alto, mas toda coradinha e tão fresquinha. Tinhas uns olhos, uns olhos cor de, de que cor são os teus olhos, Glória? Eu bebia uma Super Bock e tu olhaste para mim mas eu não tive a certeza. Confirmaste-mo oito dias depois, eu sozinho, o Sarafim nas Antas e ver o jogo contra o Beira Mar e com a mão enfiada na parreca da Benilde, e eu para ali, aos caídos, abandonado como um cãozito sarnento, à espreita de um sinal, de um sorriso, perdoa-me a poesia. Deste-me ambos os dois, e confirmaste-mo. Mas nada de avanços, parte a parte, o respeito é muito bonito e os parolos dos teus pais, sem ofensa, gostavam muito, atenta e vigilantemente. Levava eu já perdida quase toda a primeira volta do campeonato, confortado pelos relatos do tijolo do Sarafim, "alô, Nuno!", quando te dignaste, muito dissimulada, num aceno de cabeça, dar-me sinal de Follow me. Alvorocei-me para vos levar as gasosas à mesa, a ti, minha riqueza, e aos parolos dos teus pais, não desfazendo.
Perguntaste-me o meu nome e eu disse-te a verdade, mostrando-te o cartão de sócio do FC Porto: Joaquim Maria dos Passos Eleutério, isto é, Quitério. Admiraste-te: Joaquim Maria dos Passos Eleutério, isto é, Quitério, que nome tão esquisito? E eu expliquei: quer-se dizer, o meu pai era Eleutério, minha mãe era dos Passos, o padrinho Joaquim e a madrinha Maria. Resulta realmente um nome de merda, desculpa-me a expressão, e confesso que tentei esconder o enxovalho nominal assinando Joaquim Eleutério, tinha esse direito, mas nem assim me convenci. Que se segue, agarrei no Joaquim e no Eleutério, espremi-os a ver o que davam, experimentei todas as combinações possíveis e imaginárias, e optei pela criação, inventei-me: aproveitei as sobras, casei-as e rebaptizei-me Quitério, que sempre é um nome assim mais coisa e tal. Mas chama-me Quim e beija-me na boca. Não, não ligues, é uma brincadeiras cá das minhas. Quê? O Sarafim e a Benilde, nunca mais os vi. Sim, fiquei com o tijolo do Sarafim, e o que é que essa merda interessa para a nossa conversa?...

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